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A (des)necessária atuação do Ministério Público em ações sem direito ou interesse de pessoa incapaz à luz do Art. 178, II, do Código de Processo Civil

2 de jul. 2020 Vagner Franco

A celeridade processual e a efetividade da prestação jurisdicional são normas fundamentais consagradas pelo Código de Processo Civil em vigor desde 2016.

Isso significa dizer que, o juiz, como elemento fundamental da triangulação processual e do impulso oficial, tem papel especial no controle de legalidade dos atos praticados pelas partes nos autos do processo, independentemente da intervenção do Ministério Público.

Dessa forma, cabe ao magistrado atuar para a regularidade processual, para celeridade e também como "fiscal de lei", notadamente porque persistiu no atual CPC o “poder geral de cautela” do juiz e a este é dada a missão de entregar a prestação jurisdicional na integralidade, tudo na forma do que estabelecem as normas fundamentais do CPC nos termos dos artigos 1º a 12.

Nesse sentido, quem milita no direito de família está acostumado com a intervenção do Ministério Público em todas as fases das ações de alimentos. É a praxe forense. Mas, diante dessa atuação padronizada do MP e dos novos paradigmas do atual CPC, essa praxe contribui para celeridade e efetividade da prestação jurisdicional?

Sendo mais direto: o MP está obrigado a atuar em todas as ações de alimentos, ainda que não exista interesse de pessoa incapaz? Já adianto que NÃO; e explico aqui os motivos, cujos fundamentos são a própria lei de alimentos, o art. 129 da Constituição Federal e o art. 178 do CPC, respectivamente nessa ordem.

As Leis e a Constitução Federal

A Lei 5.478/68, que dispõe sobre a ação de alimentos, possui 29 artigos e nenhum deles prevê a atuação obrigatória do Ministério Público na ação por ela disciplinada. O parquet é mencionado na lei quatro vezes em dois artigos, limitados à atuação do órgão ao momento da audiência de instrução e julgamento (art. 9º e 11).

Por sua vez, o art. 129 da Constituição Federal descreve as “funções institucionais” MP em nove incisos. Em nenhum deles há previsão (expressa) de atuação obrigatória do órgão nas ações com interesse de pessoa incapaz, incluindo crianças, adolescentes ou pessoas maiores de 18 anos nessa condição.

O Código de Processo Civil, que de novo não tem mais nada, traz no art. 176 o que chamo de “função institucional geral” do MP. A lei processual alterou a denominação de “fiscal da lei” para “fiscal da ordem jurídica (art. 178, caput)”. É nesse ponto que devemos analisar a (des)necessária atuação do MP em determinadas ações sobre fixação, alteração ou exoneração da obrigação alimentar.

A Jurisprudência e o CPC

No Recurso Especial Nº 1.753.259, de SP, o STJ reafirmou que a ausência do MP nas ações que versem sobre direito de pessoa incapaz gera nulidade. Essa definição não se discute, eis que prevista desde o art. 82, I e art. 246 do CPC revogado de 1973 e mantida no atual código processual (Art. 178, II c/c Art. 279). O que se põe em discussão é: na ação de alimentos, em que não há direito ou interesse de incapaz, é necessária a intervenção no Ministério Público?

À luz do inciso II do art. 178 do CPC vigente a resposta é NÃO. Isso porque, por ordem da própria lei, nesses casos, o Parquet não deve atuar, tudo em razão de dar efetividade às normas fundamentais que inauguram o texto do atual CPC, especialmente a celeridade.

Na prática jurídica

Para ilustrar melhor a ideia mostro três casos, nos quais dois (alimentos) deles o juiz determinou a oitiva o MP, enquanto noutro (previdenciária), intimado a se manifestar, o órgão ministerial absteve-se de emitir parecer (não opinou) trazendo como fundamento a inexistência de pessoa incapaz no processo, tudo na forma do inciso II do art. 178 do CPC.

Nos dois primeiros, mesmo sem direito ou interesse de incapaz, o MP opinou pela procedência do pedido (e não poderia ser de outra forma). A primeira ação tratava de pedido de exoneração de alimentos feito pelo alimentante e pelas filhas maiores, que abriram mão da benesse em razão da maioridade e da autossuficiência econômica de ambas.

Na segunda ação, uma pessoa maior (21 anos), estudante universitária, pedia alimentos em face do pai, onde o MP opinou favorável. Mas chamo atenção mesmo é para a última ação, de natureza previdenciária, na qual o órgão manifestou-se no sentido de não “opinar” nos autos por não se enquadrar na hipótese do art. 178, II do CPC. Louvável, mas, até mesmo essa manifestação não deveria ter sido exarada, porquanto demanda tempo e a prática de atos processuais.

Nesse último caso (e nos outros também), o juiz sequer deveria ter mandado intimar o MP. Por uma razão simples: o próprio juiz é capaz de aferir a regularidade da ação e das partes postulantes, devendo impulsionar o processo sem a intervenção do MP por expressa disposição da lei (não havia direito ou interesse de pessoa incapaz), tampouco havia feição de prejuízo às partes.

Nessas três ações, em ao menos duas delas, houve pedido de que a intervenção do MP fosse dispensada em razão do que prevê o próprio CPC. Mesmo assim, o juiz determinou a intimação do órgão. No pedido de exoneração de alimentos feito por três pessoas plenamente capazes, vejam só, a demora entre a “inda e vinda” dos autos ao MP foi de quase 2 (dois) meses (isso em autos eletrônicos).

Na primeira “vista”, o órgão não viu cópia da decisão que fixou os alimentos e que já estava nos autos. O processo volta após manifestação do Parquet “pedindo” que as partes juntem cópia da referida decisão (que já estava nos autos, reafirmo). Lá se foram os primeiros 30 dias. A manifestação das partes foi no sentido de dizer o óbvio: a cópia já está nos autos, evento X, documento Y.

Novo vai e vem. Na segunda “vista”, o MP manifestou-se pela homologação do acordo, já que, diante da regularidade do processo, não poderia o órgão fiscalizador dizer outra coisa, porquanto o MP não tem poder legal de mitigar a capacidade civil das partes. Quase 60 dias para dizer o que o juiz, sozinho, tinha condição (legal) de também dizer.

No segundo grau a "praxe" não é diferente. Outro processo, em sede de agravo de instrumento, mesmo a parte pedindo que não houvesse manifestação da procuradoria atuante no tribunal, por força do Art. 178, II, do CPC, o relatou determinou que o Parquet emitisse parecer. Mais uma vez o órgão disse o óbvio.

Conclusão

Portanto, em situações como estas, fica claro que a atuação do MP, em homenagem aos princípios da celeridade e da efetividade jurisdicional, é legalmente dispensável; devendo o juiz decidir de plano, quando for caso, sem qualquer feição de nulidade.

É preciso abandonar “praxes” forenses que impliquem em atraso na efetividade jurisdicional e, sobretudo, no que se refere ao resultado útil do processo. Por isso, sendo você jovem advogado/advogada atuante na área, se não for hipótese de atuação do Ministério Público por ausência de previsão legal, faça o “requerimento” de dispensa ao juiz logo na petição inicial, reforçando a necessidade de observência irrestrita das normas do atual CPC.

IMAGEM: Reprodução/Google Imagens (Pesquisa em 2 de jul. 2020).

Sobre o autor

Vagner Franco: Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande - FURG. Pós-Graduando em Prática Jurídica Social (Residência Jurídica do PPGD/FURG) e Direito Processual Civil. Atua como advogado voluntário no EMAJ - Escritório Modelo de Assessoria Jurídica (Núcleo de Prática Jurídica/FURG). É Tecnólogo em Processos Gerenciais pelo Centro Universitário Internacional (Curitiba/PR, 2009). Técnico de Informática e programador nas horas vagas. Pesquisador. Fundador do NEJS - Núcleo de Estudos Jurídicos e Sociais. Membro do Conselho Pedagógico do IBRAJU - Instituto Brasileiro de Aperfeiçoamento Jurídico (https://www.ibraju.com.br).

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